Anticoncepcional: Amigo ou Inimigo?

Dr. Maurício Simões Abrão, Ginecologia e Obstetrícia

Publicado em 10/11/2020 - Atualizado em 02/05/2024



Os anticoncepcionais atingem taxas de 75% de adesão em todo o mundo, permanecendo, entretanto, inacessíveis para 200 milhões de mulheres, segundo dados da ONU. Consideradas as diferenças sociais, culturais e políticas, os métodos contraceptivos impactam não somente a saúde das mulheres e seu planejamento familiar, mas também sua independência afetiva e financeira.

Qualquer discussão sobre contracepção deve considerar uma série de fatores que dizem respeito às escolhas que as mulheres realizam sobre seus próprios corpos. Preocupação com renda, tempo, carreira, estabilidade nos relacionamentos e mesmo a intensidade da vida sexual fazem parte das decisões que a mulher precisa tomar em conjunto com seu médico.

O método contraceptivo pode ser um grande aliado da mulher moderna, contanto que a sua escolha, necessariamente, avalie a adequação ao estilo de vida, considerando as diferentes taxas de eficácia e, sobretudo, os efeitos colaterais e riscos associados.

Tecnicamente existem duas grandes categorias para escolha: os reversíveis, que incluem métodos hormonais, comportamentais, de barreira, dispositivos intrauterinos e de emergência; e os definitivos, realizados por via cirúrgica, seja ela feminina ou masculina.

Métodos hormonais

Diante da infinidade de contraceptivos hormonais disponíveis no mercado atual, é possível encontrar produtos que utilizam hormônios simples ou combinados. Os hormônios utilizados são o estrogênio, hormônio produzido na primeira fase do ciclo menstrual relacionado à feminilidade e a progesterona, hormônio produzido na segunda fase do ciclo e que barra o excesso estrogênico. Os métodos podem ser orais, injetáveis, implantes, adesivos, anéis vaginais ou intrauterinos.

Pílulas

As pílulas, escolha de 27% das brasileiras em idade fértil, têm como principal linha de ação o bloqueio da ovulação, evitando a menstruação, regulando problemas hormonais e até outros distúrbios, como cistos ovarianos e endometriose. As pílulas podem conter combinações de hormônios ou apenas progesterona, que pode ser usada mesmo durante a amamentação e atua menos ao impedir a ovulação e mais como método de barreira.

Por outro lado, diversos efeitos nocivos também foram relatados por usuárias e confirmados em estudos internacionais. Sintomas desde dores de cabeça, retenção de líquido e vômitos, passando por alteração do metabolismo de carboidratos e gorduras, até casos mais graves, como o impacto na coagulação do sangue, colaborando para quadros de trombose em pacientes com predisposição a estes eventos.

Anéis Vaginais

Os anéis vaginais possuem ação semelhante aos anticoncepcionais orais combinados e se popularizaram como alternativas ao uso da pílula, inclusive para pacientes que experimentam efeitos colaterais como irritação estomacal e intestinal. Entre os benefícios do método, destacam-se o fácil uso com uma única inserção mensal e a diminuição dos sintomas menstruais, como cólicas e dores pélvicas.

Os riscos são semelhantes aos comprimidos e os medos comuns, como incômodo nas relações, foram desmistificados por pesquisas clínicas com usuárias de curto e longo prazo.

Adesivos

Os adesivos, patchs transdérmicos, devem ser aplicados semanalmente e trazem o mecanismo de funcionamento e efeitos colaterais semelhantes aos das pílulas hormonais combinadas. Dentre os benefícios, pode-se citar a facilidade de aplicação, a prevenção de câncer de endométrio e ovário e, além disso, acredita-se que a interação com outros medicamentos seja menor do que no caso das pílulas. Os riscos também incluem possíveis complicações tromboembólicas.

Injetáveis

Os anticoncepcionais injetáveis podem ser mensais ou trimestrais e suas composições hormonais, bem como benefícios e riscos são diferentes entre si.

Injeções mensais - O método combina dois hormônios: estrogênio e progesterona, com a possível manutenção do ciclo menstrual, porém inibindo a ovulação. 

Injeções trimensais - Não contém estrogênio e tendem a interromper o ciclo menstrual durante os 90 dias de duração do medicamento. Representam uma opção para pacientes com contraindicações e intolerância ao uso da progesterona, como doenças relacionadas à coagulação. Destaca-se também a conveniência em relação a outros métodos, impedindo falhas pelo uso diário e pela interação com outros medicamentos que comprometem o efeito anticoncepcional.

Os efeitos colaterais podem incluir sangramento menstrual irregular, sensibilidade mamária, ganho de peso, depressão, acne e dores de cabeça.

Implantes

Os implantes também apresentam diferentes fórmulas e aplicações, sendo a utilização mais comum a de progestagênios, com o objetivo geral de utilizar doses diárias menores, liberadas prolongadamente, atingindo durações de até 3 anos. Além da alta taxa de eficácia, esse método também apresenta benefícios para grande parte das usuárias como a ausência de menstruação, diminuição dos riscos de câncer de endométrio, bem como das dores pélvicas causadas por endometriose.

Os efeitos colaterais que podem ser observados são a dor de cabeça, aumento de peso, acne, dor mamária e instabilidade emocional.

DIUs

Os dispositivos intra-uterinos possuem diferentes modos de ação e estão disponíveis em diversos modelos e formatos: cobre, não medicados e os medicados.

DIU de cobre: consiste em um fio de prata corado com cobre, causando mudanças no endométrio e no muco cervical. Os íons de cobre inibem algumas enzimas endometriais, dificultam a locomoção do esperma e previnem a fertilização ao afetar esse transporte e sua capacidade de penetração no muco, não afetando a ovulação feminina.

Com ampla indicação e eficácia, permite o seu uso a longo prazo e pode ser um grande aliado para mulheres que amamentam e/ou com contraindicações aos hormônios. Os riscos contemplam a expulsão do dispositivo, infecções e perfurações uterinas na inserção (infrequentes). Os efeitos colaterais adversos podem ser: aumento do sangramento e da dor.

DIU Hormonal (SIU-LNG): diferentemente dos outros dispositivos intra-uterinos, age através da liberação de hormônios (levonorgestrel,um tipo de progestógeno), alterando as características da região endometrial. Seu uso tem sido amplamente incentivado também por conta dos demais benefícios não contraceptivos que apresenta, como a diminuição ou ausência da menstruação e a diminuição das cólicas menstruais, auxiliando, principalmente, mulheres com endometriose.

Como efeitos adversos pode ocasionar dor, sangramentos irregulares. Recentemente foi lançado um DIU Hormonal com menor dose de progesterona, possivelmente com menos efeitos colaterais.

Contracepção de emergência

Diante da ausência de outros métodos, os contraceptivos de emergência figuram como uma alternativa eficaz e segura para as mulheres. Utilizados na prevenção de gestações não programadas, após relações sexuais desprotegidas, falhas (reais ou presumidas) em outros métodos ou mesmo casos de violência sexual. Entretanto, seu uso programado ou planejado deve ser evitado.

Eternizados sob a alcunha da pílula do dia seguinte, sua aplicação difere em cada uma das fases do ciclo e também dos tipos de pílula escolhidos. Na primeira fase do ciclo, impedem a ovulação; na segunda fase, alteram o mecanismo de transporte dos gametas e impedem a fecundação. Os efeitos colaterais incluem náuseas, vômitos e dores de cabeça e também existem contra indicações para mulheres com diabetes e históricos de problemas vasculares.

Métodos de barreira

Os métodos contraceptivos de barreira são removíveis e evitam a entrada do esperma no útero. Esses contraceptivos são indicados às mulheres para as quais os hormônios não estejam indicados, mulheres que procuram pelo aumento da segurança contraceptiva por combinação de métodos e/ou que desejam proteção contra DSTs. São eles:

Espermicidas

Encontrado em diversas apresentações comerciais - de comprimidos vaginais até pomadas em gel -  o princípio ativo mais comum é o nonoxinol, que inativa os espermatozoides e impede sua migração até o útero. Apesar de não desencadear efeitos sistêmicos e poder ser utilizado durante a lactação, sua eficácia sem associação a outros métodos de barreira é baixa.

Preservativo masculino e feminino

Popularmente conhecidos como camisinhas, os preservativos são grandes aliados à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Sua eficácia contraceptiva é completamente dependente de seu uso correto. As falhas comuns como o rompimento do material ou o deslizamento derivam, em geral, do mau uso e quando perceptíveis podem acompanhar o uso de contraceptivos de emergência. As contraindicações são poucas e costumam estar associadas à alergia ao látex ou outro material na composição do preservativo. 

Diafragma e proteção cervical

Isento de efeitos sistêmicos e alternativa de baixo custo devido à grande vida útil, os diafragmas possuem diferentes modelos e devem ser escolhidos com a ajuda do ginecologista para encontrar as medidas corretas e aprender sobre sua colocação. Possuem uma grande taxa de falhas devido ao uso incorreto, além disso, funciona somente como contraceptivo e não protegem das DSTs. Dentre os efeitos colaterais principais estão a dor pélvica, cólicas e retenção urinária.

Métodos definitivos

Femininos

A anticoncepção tubária, amplamente conhecida como laqueadura ou ligadura tubária. Utilizando diferentes técnicas e uso de diferentes dispositivos, sua aplicação se popularizou pela possibilidade de serem realizadas durante o parto cesárea.  Pode ser feita também por laparoscopia, via vaginal ou mesmo por uma minilaparotomia (pequena incisão abdominal), todos procedimentos cirúrgicos que requerem internação e anestesia.

Masculinos

Alternativa à contracepção feminina, a vasectomia consiste na secção dos canais deferentes, no escroto, eliminando a presença de espermatozoides no esperma, que continua sendo secretado normalmente e sem prejuízo. O procedimento é bastante simples e traz riscos menores do que as cirurgias tubárias, trazendo apenas sensibilidade local nos primeiros dias pós-cirúrgicos. 

O que podemos esperar do futuro?

A intensificação das pesquisas clínicas e acadêmicas fixa seu norte em direção ao aumento do bem estar e segurança das mulheres. Adesivos de microagulhamento, aplicativos com contracepção “on demand” e novos métodos não hormonais são promessas em fase de estudo e testes que prometem melhor eficácia, controle e redução de efeitos colaterais para mulheres.

Outra fronteira que a ciência tenta transpor é a contracepção reversível masculina, hormonal e não hormonal. Estudos indicam que injeções, adesivos, sprays nasais e pílulas hormonais podem surgir em breve como uma opção contraceptiva. A principal barreira, até o momento, seriam os efeitos colaterais para o funcionamento da fisiologia masculina com a diminuição do nível de testosterona.

O desenvolvimento de métodos masculinos ajudará a equilibrar a responsabilidade pela fertilidade e balancear os possíveis ônus que mulheres enfrentam sozinhas hoje. Seja pelo controle sobre seu corpo, pelo seu estilo de vida, planejamento familiar, vida profissional ou sexual, é imperativo que o método contraceptivo seja uma escolha onde a mulher esteja no centro da decisão. Qualquer opção precisa ser segura, eficiente e psicologicamente confortável para a mulher.

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